quinta-feira, março 10, 2011

A Reflexão do Desenvolvimento

O carnaval acabou, e desembocamos na quaresma, período de quarenta dias que antecedem a ressureição de nosso Senhor Jesus Cristo. É tempo de reflexão, e ela vem em boa hora, pois o país precisa refazer uma previsão de receitas superdimensionada para o progresso rápido, e o sul da Bahia precisa entender o maior pacote de promessas de sua história. Boa hora que trás a Campanha da Fraternidade com o tema Fraternidade e a Vida do Planeta, uma reflexão que está no centro das questões do desenvolvimento nacional e regional.
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Se o sul da Bahia ficou tanto tempo esquecido, vivendo na "autônoma ditadura social do cacau", ganhou do outro lado da moeda, uma inédita preservação de riquezas, tornou-se relíquia territorial, que agora se vê redescoberta por gregos e troianos, e é colocada na trilha das ambições do progresso nacional. Assim vem atraindo todo tipo de investimentos, de indústrias, tornou-se alvo de grandes especulações em todas as áreas, e podemos até dizer que o Sul da Bahia "está virando moda".
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É justamente nessa hora de tantos olhos sobre nós, que devemos nos conhecer e pensar nosso destino com a benção da reflexão sobre o desenvolvimento fraterno, e cuidadoso com o planeta . Reflexão que o Bispo Dom Mauro Montagnoli nos chama com encontro marcado no próximo domingo na Catedral de São Sebastião.
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De uma coisa já sabemos: o sul da Bahia está encontrando a porta de saída da crise econômica com suas próprias pernas, e prova disso são os investimentos privados no comércio, habitação e rede hoteleira, os milhares de turistas, etc. Mas existem muitas ideias vindas de fora que precisamos entender, e não são apenas ideias, são também interesses que precisamos conhecer a fundo.
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O pacote de projetos é grande, é impactante, é preocupante e precisa de todos os cuidados para que reflitam realmente a busca da felicidade, e que não venham a se tornar crimes contra a esperança de superação de um povo tão sofrido como o nosso.
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Ainda é um pacote de incertezas, visto que nas últimas décadas essa região foi desrespeitada com promessas políticas salvadoras inúmeras vezes. Mas, se por um lado, promessas nos assustam, temos também mais lideranças, e não apenas políticas, mas de toda uma sociedade se inteirando, que começa a se pertencer e se mobilizar por ideias. É como se a gente voltasse a sonhar com as mudanças necessárias e a realização de alguns projetos historicamente reivindicados.
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Entre os projetos fundamentais e necessários que esperamos durante décadas estão a duplicação da Ilhéus-Itabuna e a Estrada Canavieiras-Belmonte, mas tem outros que nunca fizeram parte do sonho regional, como uma estrada de ferro cruzando a Trilha Náutica da Lagoa Encantada e um Porto de Minérios na Ponta da Tulha. Temos também o "projeto fantasma" Porto Sul, o mais comentado, apesar de não existir e não ter sido apresentado para a sociedade. Fico arrepiado, afinal, não sou o único a perceber que o sul da Bahia é daqueles lugares extraordinariamente sensíveis que necessita de muito planejamento para se desenvolver sem destruir.

Por enquanto, nenhum sinal de obras ou grandes destruições extra corriqueiras de uma administração pública ineficiente no item planejamento do uso e ocupação do solo. Sabemos, no entanto, que essas grandes obras vão precisar não apenas de dinheiro, por sinal, muito dinheiro para um povo tão pobre e com um sistema de saúde e educação tão frágil, para uma comunidade vitimada pelo crack, sem nenhuma assistência aos dependentes, para uma gente que chora uma "interminável "lista" de jovens assassinados, especialmente jovens negros das periferias.

Vai precisar de muito mais que dinheiro! Vamos precisar de informação, de tecnologia de competência, e, sobretudo, de um forte compromisso com a ética, a vida e as futuras gerações. Mas eu acredito que vamos encontrar esse caminho abrindo a mente para a consciência ambiental, fazendo parcerias de vanguarda e se apoiando na boa ciência. Em um caminho novo, alternativo, em um novo modelo de desenvolvimento e uma nova realidade econômica, reciclada com os erros do passado e renovada com as tecnologias do futuro.
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Um futuro melhor para o homem e para a vida, como desfrutam os países do norte, tão à frente de nós quando o assunto é a proteção dos cidadãos e o rigor dos investimentos em agricultura, ecologia, indústria limpa, ciência e tecnologia, turismo, cultura, educação, saúde, lazer, enfim, em tudo que todos nós tanto reclamamos e precisamos melhorar também aqui nas terras do sol.
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Mas reconhecemos que sem dinheiro fica difícil realizar. Aqui em Ilhéus, por exemplo, uma associação endividada acaba de vender o Hospital e Maternidade Santa Isabel, onde várias gerações de ilheenses nasceram por uma bagatela dividida em dez prestações. Tenho a sensação que a prefeitura não tem dinheiro para quase nada, para intervir em momentos importantes como esse, e confesso que paro pra pensar quando ouço que nossa arrecadação de ISS com o Porto de Pedra subiria de cinco para cinquenta milhões, e me pergunto: Será o dinheiro uma referência soberana quando planejamos os rumos do futuro de uma região?


A igreja diz que não e nos chama para o milagre da fraternidade e o cuidado com o planeta. As promessas que queremos ver realizadas são de vida, e de vida em abundância que nos foi dada por coração generoso de Pai. E são os mistérios desse amor e doação que é nosso dever refletir humildimente, por uma salvação inteira no Jardin de Belas Flores, lar generoso de tudo o que existe.
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São muitas as promessas de quem está interessado nesse ou naquele projeto, e estamos atordoados de tantas notícias de investimentos que parecem cair dos céus prontos a nos tornarem felizes, como se isso fosse possível sem a materialização de uma boa administração pública e de um controle social eficiente para defender a vida. Não podemos esquecer que o dinheiro constrói, mas pode subestimar não apenas a natureza, mas também as pessoas e o Brasil são prova disso.
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Por enquanto, o que chama a atenção nessa região são os investimentos privados, que estão à pleno vapor, mas ninguém tem certeza quanto aos projetos públicos, se vão realmente acontecer, e principalmente, quando e como vão acontecer. O próprio governo do estado, reeleito, passou os últimos quatro anos prometendo, mas nesse tempo, a obra mais importante iniciada foi o Terminal Pesqueiro de Ilhéus.

Vimos ações emergenciais do governo federal na área habitacional e de saneamento, mas não fomos além disso. Nos últimos quatro anos, vimos muito mais da iniciativa privada com seus super shops, redes de supermercados e edifícios dizendo claramente "não acreditamos que essa é uma terra falida". Nos próximos quatro anos, esperamos então, que investimentos maiores sejam realizados, muitos dos quais, de grande impacto e com necessidade de bom planejamento, e planejar é refletir, e na democracia, refletir com o povo.
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Com esse emaranhado de expectativas, a sociedade está acordando através de redes e movimentos organizados. Entrou em ação a Associação Ação Ilhéus, que resolveu levar o "verbo refletidor" para a mesa dos políticos, e a exigir transparência pública. A associação recebeu apoio de um movimento maior, a Rede Sul da Bahia, que tem como inspiração, a defesa de um modelo de desenvolvimento norteado pela valorização das especificidades e vocações regionais, e orientado para a defesa de seu patrimônio socioambiental.

Também refletindo, e angustiados com a possibilidade dos movimentos anteriores conseguirem engessar os projetos mais impactantes ao meio ambiente, surgiu o Movimento Coeso, que também defende o desenvolvimento da região, mas que discorda dos anteriores quanto a legitimidade do Complexo Porto Sul, entendendo-o como um projeto âncora, redentor de nossa economia e quadro grave de desigualdade social. Um movimento de reflexão como os demais, mas que ainda não reconhece, como a Igreja está fazendo, que já foi o tempo em que cuidar do planeta era uma cachaça de eco-chatos, ou bio-desagradáveis, expressão mais atual para definir os eco-exagerados.

Mas por aqui não há exagero. Somos campeões quando o assunto é riqueza natural, e em minha opinião, esse é o nosso diferencial e nossa grande âncora para o futuro. Também precisamos compreender que meio ambiente não é mais uma agenda partidária do movimento ambientalista, assim como o tema da sustentabilidade não se restringe mais à questão puramente ecológica, tomando forma como expressão de um pacto de todos os setores da sociedade para garantir que as nossas conquistas sejam perenes.
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Seja como for, nossa reflexão tem sido vitoriosa. Ela ganha força todo dia na imprensa regional e muito além de nossas fronteiras, está nos fazendo pensar. O fato de estarmos se posicionando, ouvindo, buscando aliados para nossas ideias, discutindo alto e até mesmo "apelando aos nervos" já é um bom sinal. Se não somos unânimes, isso já sinaliza que estamos caminhando num movimento que vai dar na reflexão.


Se o carnaval acabou, e o ano começou, como dizemos no Brasil, é hora de acordar para um 2011 que se anuncia de arrocho geral, guardando as fantasias e pondo os pés no chão para rever nossos projetos de vida e reavaliar prioridades. Esse é um ano de pensar o futuro resolvendo os tantos problemas que já temos sem criar outros pela pressa capitalista. Se tudo passa, se nós estamos passando por aqui, se só o amor à vida não passa, não podemos deixar outra herança para os nossos filhos.
Veja a seguir 16 promessas e fiquemos de olhos abertos com a direção e o andar da carruagem, cientes que a maioria dos projetos não estão definidos, ou não têm licenciamento, ou não tem dinheiro previsto no orçamento, e portanto, também não possuem cronogramas de execução imagináveis. Mas Acorda Meu Povo (povo de Deus), que nós somos a força para fazer acontecer tudo aquilo que acreditamos de verdade.
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1 - Duplicação da Ilhéus - Itabuna
um dos projetos mais esperados de todos os tempos ainda não está definido, e ainda não temos nem o termo de referência para inicío dos estudos de impacto. Vamos nessa que o tempo urge, o governo passa e as promessas ficam.
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2 - Acesso Rodoviário da Entrada de Ilhéus
não existe projeto, não se sabe como seria o acesso da estrada duplicada até Ilhéus. Pensa-se em novas pontes e na possibilidade de ligação com o Nelson Costa. Não existe previsão orçamentária

3 - Construção do Semi Anel Rodoviário de Ilhéus
é fundamental para Ilhéus e redireciona o tráfego da BR duplicada de forma estratégica para a zona norte e sul da cidade. Já existe projeto antigo mas caminha devagar e tem estudos previstos para apenas um trecho.

4 - Construção do Semi Anel Rodoviário de Itabuna
é fundamental para Itabuna e para o projeto de região metropolitana, mas não tem projeto apresentado.

5 - Nova Ponte Ilhéus - Pontal
a comunidade está confusa e ainda não apresentou um projeto. Existem duas opções e as duas são essenciais de serem realizadas, só que em momentos diferentes. É uma questão de planejar obras de curto, médio e longo prazo. O problema é que temos dificuldade de planejar, e não podemos correr o risco de ficar sem a segunda ponte, uma "urgência hospitalar" para a cidade. Se não podemos ter Oscar Niemeyer (não sei por que), que chamem o melhor para nos ajudar a resolver esse problema com grandeza e com beleza.
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6 - Nova Orla de Ilhéus
a primeira reivindicação desse blog é fundamental e poderá ser um marco na melhoria dos serviços urbanos de Ilhéus, mais que isso, deverá recuperar a nossa auto estima se for bem realizado. Não existe mobilização, apesar de a área ociosa ser maior que todo o congestionado centro da cidade. A falta de um projeto (discutido com a comunidade) nos condena a esperar, apesar do Ministério das Cidades ter condições de atender essa demanda.
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7 - Estrada Canavieiras - Belmonte
é uma reivindicação histórica de nossa região, e vai beneficiar milhares de pessoas, encrtar distâncias, revelar paisagens novas e fortalecer o turismo. É agora ou nunca !

8 - Zona de Processamento e Exportação
será que existem dúvidas? A imprensa denuncia que as obras pararam e o escritório local está fechado.

9 - Aeroporto Internacional de Ilhéus
em fase de estudo, tem previsão de localização inadequada na APA Lagoa Encantada, mas é fundamental para o nosso futuro. Tenho esperança que seja redirecionado para o complexo de investimentos entre Ilhéus e Itabuna, como já foi pensado.

10 - Ferrovia Leste - Oeste
é a obra mais adiantada no licenciamento, mas são fortes os indicativos de que ela não desemboque no sul da Bahia, já que o licenciamento do porto privado vem encontrando fortes resistências do IBAMA e da opinião pública nacional.
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11 - Porto de Pedra
a obra enfrenta problemas sérios de licenciamento, e terá que enfrentar uma grande batalha com a justiça e a opinião pública caso continue projetada sob uma área de proteção ambiental reconhecida internacionalmente.
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12 - Porto Sul -
projeto do Governo Federal que eu chamei de fantasma por nunca ter sido explicado à população e nem apresentado ao IBAMA.

13 - Vila Olímpica de Ilhéus
uma ideia necessária que ouvi o prefeito sinalizar esses dias. Tem tudo para ser verdade, reorientando uma nova cidade, menos concentrada, reutilizando o espaço do atual campo no centro em benefício da comunidade. Estou na torcida que façamos um projeto e possamos aproveitar os recursos direcionados para a Copa 2014!
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14 - Aterro Sanitário
o escandaloso exemplo de desperdício de dinheiro público ainda está sem solução definitiva. O projeto realizado não deu certo. Precisamos de uma reengenharia completa, mas caminhamos com a promessa de resolvê-lo em breve... Será breve mesmo ?

15 - Orla Norte de Ilhéus
o prefeito anunciou, eu li, a emenda de recursos foi da então deputada Lídice da Mata, eu já reivindiquei aqui e não vejo a hora de Ilhéus, depois de séculos ter essa parte de sua orla central finalmente urbanizada. Vai melhorar o trânsito, e que paisagem extraordinária vai ser finalmente compartilhada, não é mesmo? Mas pesa a minha consciência que o governo não encare o problema da invasão da Orla da Barra, essencial para que essa nova avenida desemboque no Jardim Savoia, melhorando muito o fluxo nas ruas centrais do bairro. Estamos esperando !

16 - Porto de Ilhéus
não dá para esquecer dele, está assoreado e precisa de um bom dinheiro para se recuperar, mas não tem projeto global, só tem paliativo. Não se pensa em solução para os acessos, não se fala em estruturá-lo para o turismo, além de sua administração invadir a Soares Lopes, e detonar a primeira praça de contorno da avenida, palco desmantelado e revoltante do esquecimento completo do projeto de Burle Marx - maior paisagista do mundo.

2 comentários:

Espaço do Brasil disse...

Paulo, parabéns pelo excelente texto !

Uma análise do conjunto da ópera mostra o quanto estamos defasados de um verdadeiro desenvolvimento.

Forte abraço,

Rui

Anônimo disse...

Paulo,



além das obras de infra-estrutura citadas em seu artigo, creio que é de extrema importância a realização de obras de saneamento básico com tratamento integral dos resíduos, pois Ilhéus se tornou um esgoto a céu aberto. Além disso, é urgente tambem a necessidade de uma reforma urbana, pois a cidade cresce sem nenhum planejamento; as populações carentes se instalam em zonas de risco e em condições precárias e o processo de favelização se acelera a cada dia.



As condições das moradias é mais que precária e os bairros populares são zonas de segregação social; guetos onde a miséria e a violência se reproduzem graças à inexistência de programas sociais.



É preciso que intervenções importantes sejam feitas para mudar este processo de desenvolvimento excludente, que ameaça a maior parte da população e coloca em risco o meio ambiente e os recursos naturais, pois é evidente que todos os rios desta região estão contaminados com esgotos sanitários e lixo.



Sei que estas são também suas preocupações, mas para aqueles que defendem a construção de grandes obras cabe lembrar que a educação, a saúde e reforma urbana são condições "sine quoi non" para o progresso.



Para aqueles acostumados a explorar os mais fracos, dando lhes migalhas cabe lembrar apenas um verso de uma canção de Gilberto Gil..."basta ver que o povo derrubou um czar, e derrubou de novo, quem pôs no lugar...". Pois é: não se pode esquecer que muitos impérios já cairam e a república do cacau há anos agoniza, pois há muita podridão no pouco que restou deste "império".

Dina Oliveira