sexta-feira, julho 24, 2009

Rio de lágrimas: crime e degradação

Texto de Manoel Carlos de Almeida Neto

Brasília, 23 de julho de 2009.

Precioso patrimônio da Região Cacaueira, fonte de inspiração literária e de subsistência da população ribeirinha, o Rio Cachoeira pede socorro em razão do seu estado de degradação ambiental decorrente da intensa e incessante poluição em suas águas. Em recente notícia amplamente veiculada na imprensa grapiúna, o vereador Ricardo Bacelar (PSB) aproveitou a crise vivida pela Empresa de Água e Saneamento de Itabuna (EMASA) para lembrar e denunciar que “todo o esgoto produzido em Itabuna é lançado sem tratamento no Rio Cachoeira, porque o sistema da Emasa não funciona há vários anos”.

As palavras lançadas pelo vereador grapiúna me atingiram com um raio aqui na Esplanada. Elas ardem como fogo no coração de cada filho das Terras do Sem-Fim. Ora, o meio ambiente (natural e cultural) de Ilhéus e Itabuna não pode ficar refém da incompetência do Executivo local em gerenciar e tratar o seu esgoto. Salta aos olhos que tal fato interfere no meio ambiente de Itabuna e na sustentabilidade turística de litorânea de Ilhéus devido ao lançamento de dejetos sem tratamento diretamente no rio. É tempo de iniciarmos uma mobilização contra esse crime ambiental. Fico a imaginar o esgoto produzido por uma população de 210 mil habitantes lançado no Rio Cachoeira, na Baia da Sapetinga, do Pontal e, por consequência, na costa ilheense. Meu Deus! São mais de 500 mil pessoas diretamente prejudicadas.

Trata-se, com efeito, de um dos maiores crimes ambientais em andamento na nossa região. O que fazer? Quem são os responsáveis? Onde estão os nossos direitos?

Apontar culpados ou responsáveis não é tão importante quanto fazer cessar o estado de lesividade ao meio ambiente. Entretanto, percebe-se uma crise de valores e prioridades nessa discussão. Eis a questão: [i] a EMASA corre o risco de fechar as portas porque deve R$ 20 milhões a EMBASA, [ii] a Prefeitura de Itabuna tenta salvar a EMASA com todas as suas forças, [iii] a Prefeitura de Ilhéus não toma conhecimento da questão, pois “o problema é de Itabuna”, [iv] o Ministério Público nada faz, [v] o IBAMA finge que não vê, [vi] a EMBASA, por sua vez, preocupa-se apenas em pressionar a EMASA para receber o seu crédito e retomar o controle local. Enquanto isso (...).

Mas e o Rio Cachoeira, como fica? Ah, para o Poder Público isso é apenas um pequeno e insignificante detalhe nessa história toda, o importante mesmo é receber o crédito de R$ 20 milhões e retomar o controle local, o importante é salvar a EMASA, firmar parcerias, captar recursos, contratos. Não, mil vezes não! A pirâmide de prioridades está de cabeça para baixo. O Poder Público Estadual e Municipal esqueceu que o Rio Cachoeira ocupa o ápice desta pirâmide. Ele é o meio ambiente, é fonte de vida. O mínimo que a EMASA e a EMBASA devem fazer é garantir que o esgoto não seja diretamente despejado em seu leito seja em Itabuna, seja em Ilhéus. Tenha a santa paciência!
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No âmbito constitucional, é competência comum da União, dos Estados e dos Municípios “proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas” (art. 23, VI, da CF/88). Ademais, a defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação foi erigida à categoria de princípio da ordem econômica brasileira, fundada na valorização do trabalho e na livre iniciativa (art. 170, VI, da CF/88).

Por fim, não custa relembrar que “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações" (art. 225, da CF/88)

Portanto, é nosso direito de exigir que esgoto seja tratado e não lançado diretamente no Rio Cachoeira! Essa luta não é apenas dos itabunenses, mas, sobretudo do povo de Ilhéus (destinatário final dos dejetos). Precisamos e cobramos a atuação firme do Ministério Público, do IBAMA, do Conselho Municipal do Meio Ambiente que não podem ficar inertes a esta gravíssima situação. Sabemos que o esgoto produzido em Itabuna não é o único problema do Rio Cachoeira, mas certamente é o maior deles e deve ser solucionado com urgência.

O Rio Cachoeira não pode morrer!

Manoel Carlos de Almeida Neto
Professor de Direito Constitucional. Mestre em Direito Público pela UFBA/UnB. Assessor de Ministro no STF.

quarta-feira, julho 15, 2009

A vitória da agrofloresta

CABRUCA: O MUSEU VIVO

O modelo inspirado no cacau da floresta amazônica tornou-se a marca diferencial do sul da Bahia, onde se criou uma paisagem agrícola única. Esse modo de cultivo sob milhões de árvores nativas centenárias tornou-se o maior sistema agroflorestal que se conhece, e essa herança do cacau é um patrimônio nacional. Mas a crise dessa lavoura levou os cacauicultores à descrença, de que esse extraordinário sistema ainda possa a vir a recuperar sua viabilidade econômica.

Mas quem reconhece seu valor, sabe, que o futuro sustentável do sul da Bahia depende das lições que o cacau nos ensinou. Primeiramente, porque os sistemas agroflorestais diversificados são avocação ambiental dessa região, e se soubermos buscar o reconhecimento dele, em breve, poderemos viabilizá-lo economicamente.

Um primeiro passo foi dado com a inclusão do sul da Bahia no FNE Verde, um programa federal de financiamento à conservação e controle do meio ambiente, que possui prazos de carência e de pagamento alongados. Um passo importante, que sinaliza para o reconhecimento oficial da importância ecológica da agricultura sul baiana, abrindo uma janela no caminho de políticas públicas voltadas para as nossas especificidades territoriais, busca de certificações de qualidade, e de compensações econômicas de seqüestro de carbono e combate aos agravantes da mudança climática global.

Mas tudo isto só será verdade se os agricultores do sul da Bahia acreditarem no patrimônio histórico, cultural e ambiental que chamamos Cabruca. Perante a legislação ambiental federal e estadual, trata-se de um sistema protegido, mas nem um exército de fiscais poderá evitar o desflorestamento se as pessoas que convivem com esses recursos não estiverem convencidas de sua importância.

O desenvolvimento sustentável que estamos lutando para construir deve aliar o desenvolvimento econômico à conservação florestal, mas isto só será possível se os agricultores se tornarem aliados dessa proposta.



Apesar do FNE Verde, esse sistema tradicional de cultivo está em crise, e a supressão de árvores continua sorrateiramente frente a pecuarização das fazendas de cacau, que pode ser percebida facilmente com a alteração da paisagem.
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Chegou a hora, portanto, de acreditamos no soerguimento do sul da Bahia e na valoração econômica de nosso modelo de agricultura. São diversos os estudos da CEPLAC, UESC e outras instituições que comprovam as diversas alternativas de diversificação econômica e incremento de nossa agricultura ecológica, envolvendo a conservação das cabrucas tradicionais com espécies nativas, o plantio de frutíferas, a exploração da silvicultura tropical, os plantios consorciados de seringa, palmito, flores tropicais, dentre outras.
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OS NOVOS CACAUICULTORES DEVEM SER AMBIENTALISTAS

A chegada anunciada da vassoura-de-bruxa dizimou os cacauais do sul da Bahia e fez a região, outrora próspera, mergulhar em uma crise econômica profunda com graves conseqüências. Uma verdadeira tragédia social, econômica e ambiental que nos atingiu em cheio, expulsando milhares de trabalhadores do campo para uma vida miserável nas cidades.

Apesar disso, não cruzamos os braços, e uma luta sem tréguas para reverter esse quadro passou a ser travada por políticos, técnicos, lideranças setoriais, unindo e mobilizando o conjunto da sociedade do sul da Bahia. Especialmente, uma nova geração de filhos de cacauicultores pessistiu nessa luta, movidos pela crença em nossa história e tradição na agricultura.

Aos poucos, a recuperação da vocação rural do sul da Bahia ganha força e gera resultados. As promessas começam a sair do papel, como a inclusão de toda essa região no FNE Verde Floresta. Os principais protagonistas desse movimento são llideranças da sociedade civil organizada, representantes dos cacauicultores, filhos deles, como Henrique Almeida, Fausto Pinheiro, Isidoro Lavigne e Durval Libânio, que conquistaram a todo custo, um espaço de diálogo permanente com o governo.
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Na coletiva para a imprensa ocorrida em 22 de maio de 2009 na Associação Comercial de Ilhéus, contando com a presença do Diretor Geral da CEPLAC, Jay Wallace, mais uma oportunidade de "diálogos do cacau" com esperança nos olhos, e satisfação por mais uma vitória alcançada.
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A CEPLAC é o símbolo maior dessa história, e deve ser fortalecida para além da crise passageira, em lições de sustentabilidade futura, visando a consolidação do extraordinário sistema agroecológico do sul da Bahia.
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Um articulação exemplar entre o governo e sociedade, envolvendo o Ministério da Agricultura, a Cooperativa de Produtores da Região Cacaueira -CEPLAC, a Câmara setorial do Cacau, a Associação de Produtores de Cacau e o Instituto Cabruca, tem permitido avançar nas principais reivindicações dos produtores de cacau.
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Esperamos que os conceitos de sustentabilidade que norteiam o FNE Verde sejam irradiados para todo o sul da Bahia, e em um futuro próximo, a AMURC (Associação dos Municípios do Sul da Bahia) possa vir a ser a representante de uma identidade territorial única, fruto de um feliz casamento entre agricultura e ecologia.

A nossa globalização está na produção e promoção do consumo do chocolate de cacau do sul da Bahia como uma moeda ecológica do planeta.

quinta-feira, julho 09, 2009

Pintura no Céu de Ilhéus

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Presentes em boa parte do país, ele é um super parceiro da mata atlântica, e um velho conhecido nosso. Trata-se do periquito Jandaia, também chamado de Periquito rei ou Jandaia estrela, cujo nome científico é Aratinga áurea.
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É uma das espécies de aves que foram mais torturadas ao longo dos anos, e todos nós, em algum momento de nossas vidas vimos um deles enjaulado ou amarrado por uma cordinha. Mas com a ação dos órgãos ambientais e maior divulgação da proibição de captura de animais silvestres, as agressões a essa bela ave têm diminuído.
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Ainda assim, por dependerem das matas para se alimentarem, sua população tem diminuído em função da supressão progressiva das florestas e agroflorestas em regiões como o sul da Bahia. E se eles diminuem a floresta também perde força e vigor, e nós, ficamos mais tristes e mais pobres.
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Esses periquitos de alimentam de frutas, sementes e insetos, e atuam como grandes reflorestadores da Mata Atlântica, e em seus grandes passeios fazem um forte intercâmbio entre a mata e a restinga, a floresta e o mar.
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Na hora do descanso preferem as árvores na borda da mata até a beira da praia, e é por isso, que uma grande confraria de Jandaias resolveu fazer da avenida principal de Ilhéus, um dormitório.

De pares em pares, reuniram-se num grande bando com cerca de 1.600 indivíuos, como há muito não se via, e adotaram três amendoeiras localizadas da avenida Soares Lopes, no centro de Ilhéus como o seu local de descanço e pernoite. Chega a intrigar, porque haveriam de consolidar sua residência noturna em uma rua movimentada, barulhenta e sob oito lâmpadas acesas.

Mas isto está acontecendo aqui em Ilhéus desde março, em um verdadeiro espetáculo da liberdade. Todos os dias, a partir da 16h45 min. eles começam a chegar em pares e pequenos bandos, de várias direções ao norte e sul da cidade. O grande encontro permite que observemos inúmeras acrobacias, como os mergulhos no ar em alta velocidade.
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A grande reunião gera uma algazarra danada, enquanto escolhem seus poleiros. No dia seguinte, acordam cedo - umas seis horas, mas só voltam para as matas, onde se alimentam e se nidifificam, entre 8:00 e 8:30 min., depois de secarem suas asas, limparem os bicos, alguns fazem isso com areia, e realizarem aquecimentos de vôo. O ritual se repete todos os dias, e encanta os trauseuntes..

No Brasil, não se admite mais a captura de animais silvestres para criação em cativeiro, exceto com autorização expressa do IBAMA, mas aqueles que ainda desejam criar um pássaro como o periquito Jandaia nessas condições, pode fazê-lo com dignidade, adquirindo aves de criadouros registrados.

PETROBRÁS apoia APA Lagoa Encantada

A gestão da APA Lagoa Encantada e Rio Almada enfrenta sérios desafios para promover a sua conservação. Isto está ocorrendo, porque, de repente, ela tornou-se o centro de grandes projetos nacionais de infra-estrutura, potencialmente impactantes e poluidores.

Lá do planalto, fizeram um traçado no mapa do Brasil, e o Gasoduto Sudeste-Nordeste, que vai democratizar os benefícios do gás encanado, atravessa justamente seus delicados ecossistemas, e, como se não bastasse, fizeram no mesmo mapa, um traçado de leste a oeste para construção de uma grande ferrovia, um complexo industrial e um porto, e eles vieram dar no mesmo lugar. Também resolveram construir um novo e grande aeroporto em Ilhéus, um projeto estratégico para a região, e onde ele vai estar localizado?, aí também.

O gás encanado é extremamente necessário, melhora o acesso e a distribuição de energia, gera economias ambientais e favorece o desenvolvimento econômico e a melhoria da qualidade de vida. Uma grande ferrovia interligando os confins amazônicos com o atlântico, e a construção de um moderno porto e aeroporto, também se justificam.
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Mas uma pergunta tem de ser feita: Houve algum equívoco por parte do governo quando criou uma Área de Proteção Ambiental nesse lugar? Certamente, seus recursos extraordinários confirmam que não, mas então, para que foi criada?, e qual será o seu futuro?
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Está posto um grande desafio de Gestão Ambiental e diálogo da sociedade civil com o governo e setores empresariais. No caso da PETROBRÁS, a mais cuidada de nossas estatais, uma contrapartida do gasoduto possibilitou o inicio de algumas ações socioambientais na APA, as quais esperamos que sejam continuidas após as obras. Mas em se tratando do Projeto Complexo Porto Sul, diante da possibilidade de grande impactos ambientais, caso ele venha a ser implantado, a gestão ambiental da área enfrenterá uma séria crise de valores e princípios.

Enquanto isto, as comunidades da APA Lagoa Encantada e Rio Almada têm seus próprios projetos, que têm sido discutidos em cada reunião do Conselho Gestor. Esses projetos estão relacionados com a pavimentação da estrada para a Lagoa, reflorestamento de matas ciliares, saneamento e despoluição do rio Almada, desassoreamento da trilha náutica para a lagoa, incremento da agricultura familiar e diversificação econômica, fomento a cultura, a educação, esporte e lazer, desenvolvimento de plano estratégico de ecoturismo de base comunitária, inclusão digital, etc.
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O que temos em mão é a possibilidade de decidirmos o futuro de uma área tão especial, habitada, predominantemente, por comunidades de pescadores e pequenos agricultores, que convivem com importantes remanescentes de mata atlântica, uma das lagoas mais belas do litoral brasileiro, e uma praia que se tornou cartão postal internacionalmente conhecido. Agora, tudo isto está em nossas mãos.

A Petrobrás está apoiando uma série de projetos na APA (Área de Proteção Ambiental) Lagoa Encantada e Rio Almada, como forma de compensação à obra do gasoduto Sudeste-Nordeste, que passará por municípios da microrregião do sul da Bahia. Os projetos foram propostos pelo Conselho Gestor da APA, que reúne 30 entidades governamentais e da sociedade civil e está em atividade desde 2002.

A organização ABARÁ (Associação Brasileira de Apoio aos Recursos Ambientais) está realizando várias ações que integram o projeto “Fortalecimento da Gestão Ambiental”, envolvendo cursos de capacitação para os conselheiros, orientação para a regulamentação dos Conselhos Municipais de Meio Ambiente e criação de Fundos Municipais de Meio Ambiente, e atividades de educação ambiental nos sete municípios que integram a APA Lagoa Encantada e Rio Almada: Ilhéus, Itabuna, Uruçuca, Barro Preto, Itajuipe, Coaraci e Almadina.
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Cursos de capacitação em Gestão Ambiental já foram realizados nos sete municípios que estão na área de influência da Lagoa Encantada e Rio Almada.

O projeto tem realizado reuniões do Conselho Gestor e cursos de gestão ambiental nesses municípios, vivências ambientais na Lagoa Encantada, e uma série de atividades de comunicação, documentação, arte e educação ambiental nas comunidades. Também viabilizou a doação de equipamentos de informática para os respectivos conselhos municipais de meio ambiente. .

Mais 12 projetos apresentados por diversas instituições que compõem o Conselho Gestor da APA e Conselhos Municipais de Meio Ambiente estão sendo avaliados pela PETROBRÁS. Entre as propostas, estão a construção de sedes para conselho municipal e centro de capacitação ambiental, e diversos projetos socioambientais na região. Em Ilhéus estão previstos projetos na Colônia de Pescadores Z34, e Vilas de Juerana e Areias, localizadas às margens do rio Almada e Lagoa Encantada.

A gestão ambiental participativa de Unidades de Conservação através de um Conselho Gestor formado por representantes dos diversos setores governamentais e sociedade civil, tem se mostrado um grande instrumento para tomada de decisões. As reuniões periódicas do conselho tem permitido a integração e melhor diálogo entre as instituições, bem como o desenvolvimento de uma agenda de trabalho comprometida.