Dez anos depois da urbanização da polêmica rodovia BA 001, que cortou florestas entre o município de Ilhéus e Itacaré, já podemos fazer uma avaliação de seus impactos socioambientais, e isto é necessário que seja feito para que possamos corrigir erros, e reforçar os acertos em busca do desenvolvimento sustentável do Sul da Bahia.
A questionada “estrada ecológica” construída pelo PRODETUR veio acompanhada de um planejamento ambiental, criando um conjunto de áreas protegidas, como compensação ambiental. Foi assim que foram criadas as Áreas de Proteção Ambiental da Lagoa Encantada e Rio Almada, e a de Serra Grande-Itacaré, e o Parque Estadual da Serra do Condurú, a maior reserva protegida do sul da Bahia com cerca de 10 mil hectares. O parque foi um passo importante para a formação de um corredor de florestas e sistemas agrofloretais nessa região.
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Se o Parque foi um marco da conservação, a estrada, que também abriu essa porta, tornou-se a referência principal da primeira década de desenvolvimento intensivo do turismo no Sul da Bahia. Nesse período, como nunca antes, Ilhéus e Itacaré tornaram-se um destino procurado, conhecido e frequentado, inclusive por uma seleta constelação de cecelebridades nacionais e internacionais.
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Entre Ilhéus e Itacaré, a estrada passa pela Vila de Serra Grande, distrito do município de Uruçuca, e aí temos uma paisagem que é pura reflexão. O que havemos de pensar, quando nos deparamos com o manto verde ao longo de praias de areia branca, sob o forte azul do mar atlântico?
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Itacaré atraiu um empresariado interessado na conservação florestal para manter seus negócios com o turismo, mas trouxe consigo outros fantasmas, como a especulação e a privatização. Do ponto de vista da conservação florestal, a estrada parece ter sido boa pra Itacaré, pois no trecho ilheense, ocorre uma explosiva pressão urbana ao longa da estrada, registrando recorrentes agressões, como denunciamos em nossa reportagem Estrada Ilhéus-Itacaré: Dez Anos Depois. .
Mas a sustentabilidade do desenvolvimento não pode ser avaliada apenas pela conservação dos ecossistemas, mas pelo conjunto sócio-ambiental e econômico que se dissolve na paisagem. Ser verde por aqui é fazer justiça social com responsabilidade ecológica, o que requer uma ética comum e lideranças públicas comprometidas. .
Itacaré é um dos poucos municípios brasileiros onde a ideia de "Desmatamento Zero" vingou. A opção social pela floresta e pelo verde é perceptível e é por isso que a pequena cidade está se consolidando como referência internacional para o turismo ecológico. Mas a sustentabilidade dessa paisagem, depende, em grande parte da superação da pobreza e da exclusão social. .
Itacaré cresceu, alterando muito pouco sua vocação verde. No entanto, dez anos depois de tanta fama e badalação de luxuosos Resorts, a cidade recebeu pouquíssimos investimentos em sua estrutura. Até mesmo o passeio da avenida principal permaneceu igual, e só recentemente teve um tímido recapeamento de cimento.
Não podemos aceitar o nível investimentos públicos realizados nos anos pós-estrada, em políticas essenciais de infra-estrutura, incluindo-se aí um sistema de licenciamento e fiscalização mais eficiente.
O turismo sustentável nesse postal do verde atlântico precisa ser inclusivo, e ser um portal de valorização da cultura e tradições regionais, pois Itacaré é uma referencia para as comunidades tradicionais de pequenos agricultores, extrativistas, quilombolas e pescadores. A vocação indiscutível para o turismo e a conservação estão se tornando aliados da melhoria da qualidade de vida dessas populações.
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Nós acreditamos, que a integração dos nativos no que podemos denominar "Projeto Itacaré" pode servir de referência para o turismo sustentável do Sul da Bahia, e essa integração depende do diálogo permanente entre Nativos e Visitantes, ONG´s e Empresas, Governo e Comunidade.
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A OBRA QUE NÃO DEVIA TER SIDO LICENCIADA
As vezes, os governantes têm boas ideias, mas, por falta de uma boa acessória técnica - e diálogo, executam a boa ideia sem um planejamento correto. Assim, a prefeitura de Itacaré com recurso do governo federal (Prodetur - Projeto Orla), projetou centros de artesanato, cuja execução resultou em um grande equívoco.
A construção, agredindo o principal monumento arquitetônico da cidade, a Igreja Matriz de São Miguel e conjunto de casarões do século XVIII, que ainda se encontram em fase de tombamento definitivo, resultou em diversas ações no ministério público e no embargo da obra, que se traduz em perda de tempo e prejuízo.
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Embargada desde Julho de 2008 pelo Ministério Público e pelo Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural (IPAC), à partir da ação da sociedade civil organizada, a obra deveria ter sido discutida com a comunidade, antecipadamente, e não poderia ter sido aprovada pelo Governo Federal.
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Já a arborização das ruas com espécies nativas foi uma ideia bem executada, até mesmo os jardins de tal obra embargada, especialmente aqueles pés de cacau, tão pouco utilizados em arborização urbana. A arborização urbana com espécies nativas sinaliza para o que pode ser muito bom em Itacaré, ser verde com justiça social e qualidade de vida para todos.
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