Onze crimes ambientais da história recente de Ilhéus
No passado recente, as cidades litorâneas do Brasil sofreram grave processo de degradação ambiental. Refletir as causas e consequências dos erros cometidos, ao menos nos abre novas perspectivas. Destaco o que poderíamos chamar de onze grandes crimes ambientais que cometemos nas últimas décadas, deixando de fora os problemas sociais e a depredação do patrimônio histórico. Claro, ressaltando que o maior de todos os crimes ambientais daqui é o mesmo de muitos lugares do Brasil: A falta de saneamento básico. Também entendo que muitos justifiquem a desordem urbana com a crise do cacau, hoje melhor compreendida como uma crise econômica, ambiental, cultural, política, ou uma série de crises interligadas.
1 - A nova Cabruca e o BHC
A ocupação quase total das matas e o novo modelo de cabruca sem plano de conservação, e regado a BHC provocou um grande desastre ecológico com graves consequências para a saude humana. Enquanto o Centro de Pesquisas de Cacau revelava uma biodiversidade recorde no planeta, a mesma instituição (CEPLAC) adotava um sistema intensivo, super-produtivo, químico e sem considerar as espécies nativas não interessantes a lavoura, além da extensiva substituição do dossel florestal por árvores exóticas. O uso em larga escala e o contato direto com o BHC foi absurdo. Apesar de perigoso, era tão comum que eu mesmo me lembro do cheiro, imagine os trabalhadores das roças que ficavam cobertos pelo pó. Só me dei conta do BHC, através do escândalo do BHC deixado em um terreno em bairro pobre da Baixada Fluminense. Sobre o assunto não se falou quase nada, mas eu colhi depoimentos de antigos funcionários da CEPLAC de muitos trabalhadores que vieram a óbito com problemas pulmonares e doenças relacionadas com a contaminação provocada por esse perigoso defensivo agrícola (Relembre BHC).
2 - O engano do Porto Internacional do Malhado
Ilhéus era linda, rica, tinha porto e ferrovia. Estava tudo indo bem até que chegasse a megalomania do governo Médici com o Porto do Malhado. O objetivo era idêntico ao projeto do Porto Sul: Escoar as riquezas do oeste de olho no futuro. Era um projeto grande e milagroso, mas parou no meio, e o que fez mesmo foi destruir a cidade histórica construída com o próprio dinheiro do cacau no século anterior. Se o porto era ou não necessário é outra questão, mas ele é uma prova de um planejamento inadequado, um equívoco e o marco da destruição das qualidades urbanas de Ilhéus, além de criar problemas de mobilidade de quebrar a cabeça.
3 - Ocupação pelos condomínios de luxo no litoral sul
Nos tínhamos uma orla continuada de norte a sul, mas um precedente de ocupação chama a atenção em nossa história recente. Trata-se da ocupação dos cinco primeiros quilômetros no litoral sul, alvo de condomínios de luxo, que inauguraram o fechamento das praias e acesso às belezas naturais de Ilhéus. Ficou de fora espaço para circulação, estruturas de lazer e estacionamentos coletivos. e a orla perdeu um pouco de seu charme e potencial para a especulação elitista. A privatização de alguns acessos à praia ainda é um problema persistente no litoral sul da cidade.
4 - O fracasso do Joia do Atlântico no litoral norte
O primeiro grande condomínio no litoral norte de Ilhéus é um exemplo de tudo o que não se pode permitir na ocupação de uma bela enseada, e das consequências da falta de fiscalização do cumprimento dos planos diretores dos condomínios residenciais. O famoso Joia do Atlântico descumpriu todas as regras de urbanização, e se tornou alvo de todo tipo de crime ambiental: Retirada de areia, desmatamento, invasão de áreas de proteção e da própria praia, etc. Por fim, invadiram as margens do pequeno riacho que formam a Barra do Joia, a atração do lugar e a segunda mais bela da região, depois do Cururupe.
5 - A desgraça do Cururupe
A pequena baia do Cururupe é repetidamente destacada na literatura dos viajantes e história do Brasil. Ela foi a praia da moda durante a década de 70, mas durante os anos 80 caiu em desgraça. Primeiro instalou-se um lixão na área de entorno e formação do pequeno riacho que nasci próximo do local. A cidade virou as costas para seu cartão postal. Depois, o lixão foi retirado mas não se falou em planos de recuperação, nem análises da qualidade das águas que nos fizessem acreditar na descontaminação. Com o tempo apareceram construções absurdas, incluindo um motel na margem do rio, e mais recentemente, uma onda de invasões completou o caos, que melhor que falar é ir lá ver. E assim, o mais importante memorial natural indígena de Ilhéus, símbolo de nossa história e geografia se tornou símbolo de nossa crise.
A beleza do Cururupe mal aproveitada. Foto: Do Fundo do Baú de José Leite |
6 - O aterro de 30% dos manguezais
Por mais que Ilhéus tenha um relevo que dificulta o planejamento urbano, não se tem dúvida que o aterro de manguezais em Ilhéus foi um erro gravíssimo. Construímos os dois maiores bairros da cidade em cima do mangue, e aterramos mais de 30% de sua extensão em apenas duas décadas. Até hoje os manguezais de Ilhéus continuam sendo aterrados, um crime incomum na maioria das cidades, que já reconhecem sua importância como unidades perpetuas de conservação por muitos motivos, que após três décadas de Educação Ambiental, não podem ser ignorados.
7 - A construção do Edifício São Jorge dos Ilhéus
A ideia de que a verticalização abrupta é um sinal de progresso resultou em uma prédio altíssimo e sem nenhuma proposta arquitetônica atraente construído em pleno centro histórico, enfadando nosso mais importante equipamento turístico, a Catedral de São Sebastião de Ilhéus. Primeiro foi o Ilhéus Praia Hotel com cinco andares, e depois esse prédio enorme, encostado (colado) no pequeno prédio vizinho, a tentar alcançar o céu impunemente. Depois mudaram a lei para evitar outros do tipo, mas e agora José?
8 - Rio Cachoeira: O abandono da causa
Assistir passivo a morte de um dos mais importantes rios do litoral brasileiro é crime de omissão. O Cachoeira, assim chamado pelo seu fluxo intenso de água, muito bem historiado pelos Maximilianos, os príncipes da Áustria e da Alemanha no século XIX, chegou ao pior estágio de degradação em que se pode alcançar a degradação de um curso hídrico. A razão principal foi a ocupação irracional de pastagens ao curso dos rios Colônia e o rio Salgado. Mesmo assim, a luta pelo rio Cachoeira se resumiu ao nome de Maria Luzia (UESC), e não sensibiliza até hoje. Não tem como enxergar um futuro digno para essa região com um rio nesse estado. É preciso repactuar sua conservação, as matas de suas margens, livrá-lo dos esgotos e do lixo, parar a retirada de vegetação dos riachinhos dentro das fazendas de cacau. Sua revitalização é uma esperança da Agenda do Século XXI, e essa vitória será a nosso sinal de que o desenvolvimento finalmente chegou, e de que o nosso povo recuperou as condições mínimas de qualidade de vida.
Milhões de litros de água de vão em poucos dias, e o rio morre de novo. |
09 - Invasão na estrada Ecológica Ilhéus - Itacaré
No projeto acertado com o estado, era para ser uma estrada ecológica atravessando o litoral norte de Ilhéus, Uruçuca até Itacaré. Só que, enquanto os dois municípios adotaram a ideia, Ilhéus não teve condições de zelar a proposta. Apesar das denuncias e processos acabou-se permitindo a invasão do início da estrada na região do São Domingos. No início eram menos de cem residencias, e hoje temos um corredor de casas sem passeio com as crianças brincando na beira da rodovia. Poderia ter sido diferente, e talvez, ainda venha a ser.
Fotos de dez anos atrás na ocupação da estrada ecológica. |
10 - Tororomba sem água
É preciso destacar o ataque as florestas protetoras da nossa mais famosa fonte de água medicinal. As águas da Tororomba, alegria da infância dos ilheenses e um grande atrativo do município tem perdido suas águas ano após ano. É muito triste ver um balneário natural subestimado, e enxergar no Google que estamos mexendo naquela área. Tem uma ferida aberta naquela região e a supressão de mata nativa pode ser a causa. Destruir essas nascentes e curso de água é uma incoerência.
11 - Caramujo africano
Pouca informação e divulgação se tem sobre como aconteceu a infestação de caramujos africanos em Ilhéus. O assunto é preocupante, e o bicho está dominando a cidade. Sobre o seu combate temos aprendido mais com o vizinho do que nos ensina a vigilância sanitária e epidemiológica. Enquanto isso rondam sobre ele, hipóteses de doenças assombrosas como a Meningite. Não sabemos qual o risco que estamos correndo, e qual será a encaminhamento desse crise ecológica, manifesta nessa incômoda e realmente galopante enfestação.
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