Entrevista de Eduardo Rodrigo, Gestor do Parque Municipal da Boa Esperança, a centenária floresta e reservatório urbano de água potável de Ilhéus.


A antiga Fazenda Boa Esperança, que se transformou no Parque Municipal da Boa Esperança, já era uma área oficialmente protegida desde a década de 20. Hoje, mesmo localizada nos limites da zona urbana de Ilhéus, ainda contempla 437 hectares de floresta, sendo refúgio de espécies muito raras, e santuário de fontes de água doce.

À frente da do parque, o estudante de agronomia, Eduardo Rodrigo Ferreira, também coordenador de Unidades de Conservação da Secretaria Municipal de Meio Ambiente de Ilhéus. Eduardo fala, nessa entrevista, sobre a sua gestão na Unidade de Conservação: problemas, conquistas e desafios.

O parque está localizado em área urbana. Quais os problemas que isto acarreta a sua conservação?

# O parque da Boa Esperança possui 437 hectares, e ele é circunvizinho de cinco grandes bairros de nosso município: Banco da Vitória, Fundão, Malhado, Distrito Industrial e Vila Nazaré. Então, é comum que a gente tenha uma ligação entre zona norte e Banco da Vitória. Os limites são abertos. Hoje dispomos de guardas florestais, que inclusive foram capacitados pelo projeto Corredor Ecológico, e a função desses guardas é fiscalizar esse perímetro. Como a gente não dispõe ainda de infraestrutura adequada para visitação, para um controle total na íntegra do parque, ficamos com nossas divisas desprotegidas; mas isso não quer dizer que esses limites não sejam monitorados.


As comunidades e os agricultores do entorno colaboram com a conservação do parque?.

# Temos propriedades limítrofes do parque, e esses fazendeiros são nossos parceiros, ajudando a identificar possíveis agressores. Há duas semanas, identificamos um indivíduo que estava extraindo madeira de Biriba, uma espécie ameaçada. Recebemos a denúncia e, de imediato, nossos agentes conseguiram autuar o agressor. Isso é parte da parceria que temos com as comunidades do entorno do parque. Os guardas desempenham o papel de fiscal, mas também de educadores ambientais. Temos uma prática de abordagem mais no sentido de conversar, conscientizar. Criamos um vínculo com a comunidade, para que eles possam passar informações de degradação. Temos uma política de intervenção com respeito às comunidades vizinhas, que, sabemos, em grande maioria, são carentes, e que muitas vezes tentaram utilizar-se do parque, sem o devido conhecimento de que se trata de unidade de conservação. Hoje, a comunidade é consciente de que o local abriga uma imensa riqueza, que precisa ser protegida.

Qual a importância do Parque?.

# O parque é considerado um hotspot; ou seja, uma área quente de biodiversidade. É uma área que possui estudos realizados por CEPLAC (*), UESC (**) e The New York Botanical Garden, que identificou mais de 2.200 espécies de plantas. Trata-se de uma área com vasta riqueza de espécies da Mata Atlântica; inclusive, algumas delas, ameaçadas de extinção. Nós encontramos, no parque, por exemplo, madeiras de lei, como o pau brasil, que já não são fáceis de encontrar. A gente tem uma vasta riqueza de espécies em franco desenvolvimento, por ser uma mata primária com seu grande maciço preservado. Encontramos, também, muitas espécies de mamíferos, de primatas. Temos uma grande variedade de formigas identificadas em estudos da UESC. O parque é objeto de pesquisas acadêmicas de mestrado e doutorado do Programa de Desenvolvimento Regional e Meio Ambiente (PRODEMA).

Como o parque se insere no Corredor Ecológico?

.# O parque possui áreas bem conservadas, trilhas muito boas, fácil acesso e um fluxo gênico muito alto. O objetivo do minicorredor é criar uma conexão, um corredor ecológico, de fluxo gênico entre o Parque Municipal da Boa Esperança, a Lagoa Encantada e o Parque Estadual da Serra do Conduru.

Sabemos que alguns municípios do sul da Bahia já sofrem com a escassez de água para o abastecimento. Diante desse quadro, qual a relação do parque com a disponibilidade de água para o consumo humano?


# O objetivo inicial do município, quando adquiriu a Fazenda da Esperança, na década de 20, foi o abastecimento de água para Ilhéus. O parque abrange três grandes bacias hidrográficas de nossa região, e 51 microbacias do rio Sete Voltas. O município, atualmente, é abastecido pelas águas da Bacia do Iguape (represa no entorno do parque), e nós temos, dentro do perímetro do parque, as principais vertentes formadoras de três grandes bacias; e isso dá a garantia para o município, e, talvez, os municípios vizinhos, de abastecimento de água no futuro. Hoje existem estudos da Embasa para voltar a aproveitar essa água que temos no interior do parque, que é de altíssima qualidade, até mesmo pela dependência da cidade vizinha (Itabuna) de nossa água.
Por que o parque ainda não virou um atrativo turístico?

# O parque foi qualificado dentro da lei federal do Sistema Nacional de Unidades de Conservação na categoria de proteção integral. Nós já temos autorização prévia para realizar pesquisa científica e visitação pública, de forma controlada. Para isso, precisamos ter a infraestrutura adequada. Em 2001, o Ministério do Meio Ambiente, disponibilizou recursos para que o parque tivesse infraestrutura mínima de fiscalização, mas esses recursos não foram continuados e o projeto foi finalizado. De lá para cá, o município tem dificuldades financeiras para administrar o parque, e o que a gente consegue é, tão somente, manter uma equipe de fiscalização que trabalha todos os dias, incluindo finais de semana e feriados. Precisamos criar essa infraestrutura através de associações com organizações não governamentais,e das grandes empresas que estão instalando-se em nosso polo industrial. Isso é possível pela compensação ambiental, que é um instrumento legal. Uma infraestrutura dotada de guaritas, salas de visitação, melhoria dos acessos, etc., é muito caro, e o município não dispõe desses recursos.
Quais os desafios do Parque Municipal da Boa Esperança?

# A gente precisa dar subsídios para que as populações vizinhas possam sobreviver em harmonia com o parque. Já conseguimos diminuir a incidência de criminalidade, e voltamos a ter pesquisa no PMBE. Antes, isso não era possível pelo alto grau de violência. Pesquisadores e alunos da UESC voltaram para dentro do parque. Nosso desafio maior é manter essa biodiversidade e fazer com que a sociedade tenha conhecimento do que o PMBE representa. É muito importante manter uma unidade de proteção integral a 5 ou 10 minutos do centro da nossa cidade.
(*) Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira – Localizada no km 22 da rodovia Ilhéus/ Itabuna

(**) Universidade Estadual de Santa Cruz – Localizada no km 16 da rodovia Ilhéus/ Itabuna 

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Morro de Pernambuco - queimada e abandono

As Flores do Sul da Bahia

O Parque Marinho da Pedra de Ilhéus