O Programa de Meio Ambiente e Desenvolvimento da Universidade Estadual de Santa Cruz realizou no dia 12 de novembro um Seminário sobre o projeto do Porto Sul, atraindo mais de 500 participantes. Consideramos que o debate foi o mais aprofundado até o momento, mas ainda reivindicamos mais foco no assunto em questão, evitando-se o radicalismo dos que querem o Porto a qualquer custo, e os que se apõem não apenas a sua localização, mas a sua necessidade, ao processo de industrialização global em que ele está inserido e ao governo. Pensamos assim, porque quando o debate extrapola seus limites objetivos, isto nos faz crer, que estamos perdendo tempo em buscar uma solução real, objetiva, que seja factível e que resulte na melhor decisão compactuada.
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José Adolfo, Professor da UESC e Organizador do Seminário:
"queremos levar as questões ambientais para serem discutidas pelas comunidades".
A posição da Bahia Mineradora __________________A empresa terá que enfrentar um forte questionamento dos ambientalistas, dos órgãos ambientais e da imprensa para obter o licenciamento ambiental.
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O representante da Bahia Mineradora foi Amaury Pekelman, responsável pela comunicação social da empresa. Ele iniciou suas colocações falando sobre o mercado internacional, destacando que as reservas de ferro mundiais são da ordem de 306 bilhões de toneladas, e que o Brasil possui a sexta maior reserva e é o primeiro em exportações do produto.
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Com pouca presença governamental nos debates, os oponentes do Porto Sul têm questionado duramente os representantes da Bahia Mineradora. Eles acusam a empresa de ser a responsável pela escolha do local numa Área de Proteção Ambiental, para evitar gastos. A BM se defende, e diz que outro local, com menos embates sociais e questionamentos ambientais, seria melhor para a empresa.
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A sociedade civil organizada tem trazido para os debates uma série de questionamentos com relação aos impactos do tratamento do minério de ferro naquele local. Uma das questões é o material particulado, que pode contaminar o ar, a água e o solo. É que o que chamam de poeira de ferro, cujos níveis de padrão de exposição podem prejudicar a saúde humana e o ecossistema. A BM se defende e diz que não haverá poeira derivada da pelotização (fragmentação do ferro bruto), “outra tecnologia será utilizada e todo o material será umidificado”.
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Duramente questionado sobre impactos ambientais, Pekelman afirma que a empresa cumprirá todas as orientações dos órgãos ambientais, durante o processo de licenciamento, e que atenderá a legislação, aguardando os estudos de impacto ambiental para determinar todos os procedimentos de estocagem, umidificação e escoamento do minerio. Ele afirma que o projeto poderá utilizar tecnologia de ponta como os precipitadores eletrostáticos para reduzir em até 75% as partículas capturadas e supressores químicos para evitar poeira no transporte.
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Apesar de descaracterizar alguns mitos relacionados com os impactos, a exposição da BML não esclarece nem detalha alguns aspectos do projeto. Um dos pontos não esclarecidos refere-se ao destino da água que trará o minério e será contaminada por ele, resultando em um rejeito líquido de difícil tratamento. Neste ponto, pergunta-se: como será tratado e onde será destinado? Ao ser questionado sobre o seu lançamento no mar, a tese mais provável, Pekelman apenas informa que os estudos de impacto irão determinar a melhor alternativa, o que leva a crer a BML ainda tem dúvidas, e prefere aguardar o posicionamento dos órgãos ambientais para tomar algumas decisões técnicas, que eles próprios deveriam apresentar nos encontros públicos.
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Com relação aos questionamentos que o projeto da Bahia Mineradora é apenas a ponta de um grande complexo industrial, Pekelman afirma “não sabemos se existem outros projetos para o Complexo Porto Sul, por parte do Governo. O nosso projeto refere-se apenas ao recebimento, estocagem e transporte dos minérios até os navios. Não vamos produzir nada no local".
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. "Pekelman, da BML, tentando responder a pergunta de Adriano Wild do IESB (camisa azul): Porque vocês não detalham o que pretendem fazer tecnicamente nesse projeto?"
Marilene Lapa _____________________________“O Complexo Sul é um projeto pertinente, ainda que possa ser reavaliada a sua localização”
A arquiteta Marilene Lapa, da prefeitura municipal de Ilhéus fez o questionamento mais contundente em defesa do Porto Sul. Ela destacou que o Brasil é um país continental e com enormes demandas sociais pra enfrentar, e que precisa de um grande projeto de comunicação que inclui a infra-estrutura porto ferroviária para fortalecer sua dinâmica econômica frente ao comercio internacional. Marilene criticou o foco do debate apenas direcionado para a defesa do turismo, por “não enxergar uma política consistente para o turismo nessa região, que seja realmente sustentável e inclusiva”, e “por perceber uma terrível especulação privatizante de nossas praias e florestas, sem interesse na comunidade local”.
Segundo ela, é necessário focar o debate em políticas concretas, relacionadas com o fortalecimento das ações locais, para melhorar a qualidade de vida e a conservação ambiental em nosso litoral, e não apenas criar-se uma frente de oposição sistemática ao Governo e Empresas envolvidos no projeto do Complexo Porto Sul. Ela destaca, “temos muito que fazer nessa região para realmente proteger o meio ambiente”, como por exemplo, “evitar a degradação das ocupações irregulares”; “deveríamos estar atentos a questões como as leis complementares do Plano Diretor do município e realização da regularização fundiária no litoral norte, que está colaborando com a degradação ambiental”.
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Marilene encerrou seu questionamento reafirmando que o Complexo Porto Sul é um projeto pertinente e questionando ao ambientalista Rui Rocha o seguinte: “afinal, vocês são contra o projeto ou o problema é a sua localização?”
Rui Rocha ____________________________
"precisamos respeitar as vocações dessa região para que o desenvolvimento seja sustentável a longo prazo".
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O ambientalista Rui Rocha da ONG Floresta Viva é contrário ao projeto que visa implantar um novo Complexo Portuário no Sul da Bahia. Ele respondeu ao questionamento da arquiteta Marilene Lapa, colocando-se contra a sua localização em área de proteção ambiental, e questionando o modelo de desenvolvimento que o governo está adotando para essa região.
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Para Rui, a vocação primordial do Sul da Bahia para atingir o desenvolvimento sustentável está centrada em cinco pilares fundamentais: o Turismo, a Pesca, os Sistemas Agroflorestais e o Chocolate, o Conhecimento (Ciência e Tecnologia, que inclui as universidades) e o Polo de Informática, além de outras alternativas como o palmito, frutas, latex e a estrutura portuária já existente. Para ele, o novo projeto Porto Sul desvia esse foco e põe em risco toda essa região. Ele denuncia a brusca mudança da política de governo que priorizou e incentivou o turismo, criando áreas protegidas e atraindo milhões em investimentos para o setor.
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Rui acredita que está havendo uma mudança radical na perspectiva de desenvolvimento regional e para ele, isto se deve a uma política de governo baseada no imediatismo, e que não prevê as conseqüências de longo prazo. Segundo ele, o Brasil tem de rever o modelo de desenvolvimento, como a comercialização de matérias primas em estado bruto, a exemplo do ferro exportado para a China, e defende a adoção de arranjos produtivos mais articulados com as especificidades e demandas de cada região.
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Com esse pensamento, ele defende a busca de alternativas para que a exploração de recursos não renováveis como o ferro e petróleo, sejam bem aproveitadas enquanto durarem para promover habilidades econômicas permanentes, visando o fortalecimento de um sistema econômico regional articulado com as vocações territoriais, e assim, tornar possível a geração de valores qualitativos para o desenvolvimento sustentável de longo prazo.
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O ambientalista destaca que o Sul da Bahia possui qualidades ambientais extraordinárias, e tem um dos litorais mais bem conservados do mundo, que merece cuidados especiais. Ele reconhece que existem interesses especulativos na indústria do turismo, mas defende que o setor deve ser orientado e fiscalizado para assumirem o compromisso social e ambiental, e acrescenta que "existem exemplos positivos de diversos empreendedores que apostam na conservação ambiental e que têm envolvido a comunidade, preservando os recursos naturais e gerando o menor impacto possível".
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Mário Mantovani __________________________“Não podemos se deslumbrar com esses projetos, o Porto Sul é um estrupo eminente”
O renomado ambientalista Mario Montovoni foi o convidado de honra, e começou seu discurso dizendo que dados recentes confirmam que a maior indústria do mundo é a indústria do turismo, “que tem como sua principal matéria prima, a natureza”, “e não mais a automobilística que estão tentando tirar da crise, e cujas ações não valem mais que um pirulito”. Ele defendeu o que chama de regras globais do turismo sustentável, e ressaltou que o Brasil e lugares como o sul da Bahia são os mais atrativos do mundo, e são apresentados lá fora, como uma região “que tem tudo”; “e não estou falando do turismo baseado em investimentos especulativos, como vem acontecendo nos empreendimentos de portugueses e espanhóis na costa norte da Bahia.”, complementou.
Mantovani atacou duramente o PAC, “estamos vivendo um momento muito perigoso na história desse país” que ele atribui “a especulação diante dos gargalos do desenvolvimento”. Segundo ele, o PAC tornou-se um processo “onde estão sendo realizados acordos escondidos, como uma ação entre amigos, onde se negociam grandes obras, cada um faz uma parte, e vem um “porta voz” do desenvolvimento dizer que o projeto é a solução para toda uma região”; “são megaprojetos, de interesse de grupos, baseado na ideologia da corrupção”, referind-se as licitações fraudulentas do PAC recentemente apuradas pelo governo, “meteram a mão no dinheiro do PAC, e isto aconteceu em Santos”.
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Mantovani protestou também contra o Governo por não atender uma resolução do CONAMA de 2002 que previa a redução do nível de enxofre no diesel a partir de 2009, como adota a comunidade européia, e o acordo que permitiu seu adiamento para 2012. Ele se referia ao fornecimento do diesel S-50, com 50 partes de enxofre para cada milhão de partículas (50 ppm), já que atualmente, o diesel usado nas regiões metropolitanas do Brasil tem 500 ppm e 2.000, em outras regiões. Indignado afirmou: “3.000 pessoas estão morrendo todo ano em São Paulo por causa desse diesel, temos de desconfiar desses acordos que não respeitam a nossa vida”.
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Continuando, Mantovani disse “Graças a Deus estourou essa crise econômica para assentar a poeira desses investimentos, e para vermos, realmente, quem é quem nesse processo”; “precisamos avaliar a extensão da crise, pois não é possível que até dinheiro do FAT- Fundo de Amparo ao Trabalhador possa ir parar na mão de especuladores", “o PAC não pode servir a esses interesses”.
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Por fim, Mantovani alertou que todos devem ficar atentos, e se perguntar: “o que eu quero, qual é o jogo?”, acrescentando que “os movimentos sociais que sempre foram símbolo de resistência estão sendo cooptados”, e, “até mesmo cientistas ilustres acabam se vendendo, às vezes, para comprar um equipamento para o seu laboratório na universidade, que o poder publico não comprou” - “temos muito que aprender ainda, o desenvolvimento é importante para todos, mas não com modelos comprovadamente ultrapassados”, complementou.
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Mantovani não descarta um “pacto eficiente e lucrativo”
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Nesse debate, ele relembrou, o esquecimento do "passivo ambiental" do Porto Internacional do Malhado,
já reivindicado em nossas reportangens. Ainda assim, mesmo discorrendo contra os possíveis esquemas do PAC, e contra a metodologia de impantação do Porto Sul, que ele descreve como "um estrupo eminente", apresentou em slides um Estudo de Caso menos radical, onde a articulação do movimento ambientalista com o Conselho Estadual de Meio Ambiente do Estado de São Paulo permitiu adequações favoráveis ao meio ambiente na construção de um Porto na Bahia de Santos.
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Segundo ele, o movimento ambientalista ajudou a realizar um “pacto eficiente e lucrativo” para o meio ambiente e as comunidades locais.Trata-se do projeto da EMBRAPORT – Empresa Brasileira de Terminais Portuários em que as ONG´s conseguiram fazer rever alternativas locacionais, criar uma reserva ambiental de 500.000 m2, implementar dezenas de programas conservacionistas, voltados para a preservação da fauna e da flora, educação ambiental, etc. “Conseguimos inclusive, que a empresa despoluísse a contaminação ambiental na área, pagando pelos erros dos outros, a pedido dos ambientalistas”.
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Mantovani mostrou através desse estudo de caso que é preciso que a sociedade esteja articulada para exigir uma metodologia diferenciada onde seja possível haver transparência, participação e acompanhamento dos projetos de interesse público.
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O Empresário Paulo Lago, presente em todos os debates, integra um grupo de entidades da sociedade civil que luta sistematicamente contra o projeto do Porto Sul.
Comentários
No mais um forte abraço e continue a sua missão !
Rui Rocha.
Sensacional a matéria do Seminário da UESC-Porto Sul.
Abraços
Adriano Wild
valeu a força companheiro.... gostei muito do Blog e a forma com que apresentou as questões relativas ao Porto....Estou copiando a Ana Ligia que cuida da
nossa comunicação para onhecimento
abraços
mario mantovani
Você superou a minha expectativa quanto à memória do Seminário. Excelente a matéria, GENTE COMO VOCÊ É QUE FAZ A DIFERENÇA E NOS FAZ ORGULHAR SER HUMANO!
Que Deus continue te iluminando para que a sua luz atinja àqueles que ainda estão nas trevas quanto à importancia do meio ambiente que é nosso habitat e ainda não sabem que, para a nossa preservação ele deve ser preservado e daí a importancia de toda espécie de vida.
Um grande e afetuoso abraço
Maria do Socorro Mendonça