Porto Sul: Alternativas Locacionais


Por Paulo Paiva
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Uns querem o Complexo Porto Sul a qualquer custo, e fecham os olhos para os problemas ambientais, outros, querem afastar o projeto irremediavelmente do Sul da Bahia por considerarem incompatível com as vocações dessa região. Mas será que nesse grande impasse ainda sobra espaço para uma solução compartilhada? Será que ainda existe alguma possibilidade de conciliação?
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O problema maior do chamado Complexo Porto Sul continua sendo a falta de clareza sobre o conjunto de projetos dessa composição, e a demanda crescente por espaço que eles acarretariam ao longo do tempo em uma área nobríssima para a conservação. Até mesmo a imprensa acostumada a apurar e investigar, se confunde com os versos e reversos desse conjunto de obras fragmentadas em diversos processos de licenciamento.
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O "Porto Sul", por exemplo, não existe enquanto projeto. É um nome de porto público emprestado ao outro porto, o "Porto de Pedra" da Bahia Mineradora. Um porto não anuncia o outro, já que um deles não está projetado, e portanto não pode ser compreendido. Além do que, se a discussão é ambiental, o outro porto significaria ocupação de mais espaço para novas atividades, e portanto, mais problemas e impactos nesse nó logístico de oportunidades de negócios dentro de uma área destinada legalmente à proteção ambiental.

Desde o início desse processo temos observado que a escolha equivocada do litoral norte de Ilhéus não obedeceu os critérios mais básicos de planejamento do uso e ocupação do espaço, e de utilização do ecossistema como unidade de referência para a ocupação territorial. Só nos resta então supor que a escolha errada do local foi motivada pelo custo financeiro imediato menor.
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Sabemos que a proteção ambiental como as tecnologias de ponta são dispendiosas, mas não adianta economizar quando o assunto é o meio ambiente, a segurança, a vida, afinal, se queremos ser desenvolvidos vamos precisar gastar muito dinheiro com qualidade e segurança ambiental. Seria portanto o dinheiro, o verdadeiro motivo pelo qual o governo e empreendedores resistem tanto a identificação de uma alternativa locacional?

TODOS OS ESTUDOS PEDEM UMA ALTERNATIVA LOCACIONAL !!!
CHEGOU A HORA DE BUSCÁ-LA COM SERIEDADE.
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O relatório final do IBAMA para a Licença Prévia (Parecer Técnico 40/2009) de construção da Ferrovia destaca a falta de uma alternativa de traçado no trecho sul da Bahia, e o mesmo IBAMA está pedindo a BAMIN, que o seu porto também apresente uma alternativa locacional.


Todos os técnicos perceberam unanimemente que o maior problema desse projeto é o mascaramento de informações sobre as alternativas locacionais. Durante as reuniões, várias vezes vimos aquela tabelinha em que, a deriva de qualquer racionalidade, direciona superficialmente o projeto para a Tulha em Ilhéus, ficando em segundo lugar, um lugar ali mesmo, na mesma praia, Aritaguá, que seria ainda mais desastroso.
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O que parece preguiça de pensar, de planejar, de obedecer as regras, encobre algum tipo de manipulação, e de um autoritarismo organizacional que precisa ser tecnicamente esclarecido. Por isso, não temos outra coisa a fazer senão exigirmos que a VALEC e a BAMIN estudem e invistam esforços para que todos possam conhecer as exigidas alternativas locacionais, e vocacionais.

QUAIS AS ALTERNATIVAS? ELAS EXISTEM?


Todas as postagens nesse Blog defendem que o governo não construa uma ferrovia que desemboque sobre a APA do Almada, e que o Complexo Porto Sul, a ZPE e o aeroporto não abram uma frente de devastação e degradação socioambiental nesse santuário reconhecido como Patrimônio dos Brasileiros e da Humanidade.
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Não é uma questão política, não se trata de defender os Resorts, nem mesmo o turismo, não é essa a questão. A questão é continuar defendendo o que sempre defendi, é proteger o que sempre estudei, é conservar um ecossistema que durante três décadas tenho compreendido como um ícone, uma relíquia, um ativo, um orgulho, um patrimônio de valor imensurável para o futuro de Ilhéus.

Não sou contra o PAC, contra a industrialização, nem tão pouco, contra a BAMIN, apesar de eu ter uma extrema curiosidade de saber quem é, e o que pensa o cazaquistanês dono da Bamin e da ENRC (Eurasian Natural Resources Corporation) sobre nós. Sempre tenho esperado que ele (não encontrei seu nome nem seu rosto no meu moderno oráculo Google) falasse com a gente, já que seus interesses podem mudar as nossas vidas e a arrumação de nossa casa.
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Eu reconheço a necessidade de ferrovias, que também devem transportar pessoas, e de novos portos no litoral brasileiro, mas luto contra a falta de planejamento estratégico do executivo, que sobrepôs e contrapôs esses projetos ao reconhecido patrimônio cultural e ecológico do litoral norte de Ilhéus. Um lugar que tornou-se símbolo internacional de preservação ambiental à partir de muito trabalho e muitos projetos do próprio governo e sociedade organizada.
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As justificativas técnicas de muitos especialistas têm demonstrado que o projeto está no pior lugar que poderia existir. Diante das pressões crescentes, o empreendedores têm o desafio de encontrar alternativas. Tenho ouvido pelos becos da notícia, que pensam em mudar o porto para Belmonte, também ouvi falar em recuo para Aritaguá, e esses dias, um deslocamento para Barramares, livrando o manto florestal íntegro vizinho da Tulha.

Os ambientalistas, por sua vez, querem a exportação de minérios fora do sul da Bahia, e não vêem condições de ajuste com esse tipo de atividade por aqui. Eles apontam o Porto de Aratú como a melhor alternativa para resolver o impasse. Mas será que existiria uma possibilidade desse complexo, não apenas o Porto da Bamin, mas o Porto Sul como um todo desembocar nessa região sem afetar gravemente, pelo menos em terra firme, o nosso patrimônio ambiental?
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No meu entendimento, sim. Eu acredito que o maior problema dos projetos anunciados é a falta de planejamento estratégico e uma visão locacional que não considera a região sul da Bahia como um todo, focando todos os empreendimentos em Ilhéus.
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Ao analisarmos essa região no Google Earth percebemos que existem áreas degradadas que poderiam ser recuperadas, ao invés de degragar áreas conservadas. A ZPE, por exemplo, poderia se desenvolver numa área de milhares de hectares desmatadas entre os municípios de Itabuna, Buerarema e Ibicaraí, tendo Itapé como centro de referência.
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ÁREA COMPLETAMENTE DESMATADA, TENDO ITAPÉ AO CENTRO, PODERIA RECEBER A ZPE MUDANDO O PARADIGMA DE CRESCER IMPACTANDO E CONCERTANDO ESTRAGO PARA O PARADIGMA DE EMPREENDER RECUPERANDO O MEIO AMBIENTE.
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Nunca consegui entender como é possível, num deserto desmatado, alguém pensar em construir justamente nas manchinhas verdes remanescentes. No meu entender esses grandes empreendimentos poderiam mudar completamente o paradigma da degradação e mitigação de impactos para o conceito de empreender produzindo qualidade ambiental e regeneração florestal e hídrica.
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A área planejada para a ZPE está focada em uma grande área verde remanescente. Mas se deslocássemos esses parques industriais para a região supracitada, isto beneficiaria mais municípios, e poderia ser ainda, uma grande alavanca para a recuperação de milhares de hectares de florestas e recuperação do potencial hídrico do rio Cachoeira. Ao invés de pensar em fazer mosaicos de industrias em áreas florestais, seria revolucionário pensar em criar mosaicos florestais em áreas industriais anteriormente desérticas.
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UMA ZONA DE PROCESSAMENTO E EXPORTAÇÃO PODERIA SER ATRELADA A UM GRANDE REFLORESTAMENTO E RECUPERAÇÃO DO RIO CACHOEIRA.
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Junto com a ZPE, o aeroporto, também dentro da APA Lagoa Encantada e Rio Almada, também precisa ser reorientado para as imediações da nova estrada Ilhéus - Itabuna, projetado em conjunto com a sua duplicação, ocupando uma área de "cabruca de cacau"; uma localização mais estratégica geograficamente para os municípios (particularmente Itabuna), e serviria melhor a emergente região metropolitana sul baiana.
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E a ferrovia e os portos? Será que esses empreendimentos poderiam alcançar o sul da Bahia em algum trêcho do litoral sul, suficientemente equidistantes mais de dez quilômetros do Hotel Cana Brava e a Reserva Biológica de Una? Essa é uma proposta que foi considerada pela VALEC e BAMIN em seus estudos, mas que, segundo eles, traria problemas de relevo, mais isto não ficou claro. Não houve um detalhamento dessa alternativa, como de nenhuma outra alternativa também do porto. Ouvi uma autoridade da Casa Civil do Estado dizer que "os índios nos afastam daí".
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O PORTO E FERROVIA PODERIA SER CONSTRUÍDO COM MENORES IMPACTOS À MATA ATLÂNTICA.

Quanto a afirmativa "os índios nos afastam de daí", devo dizer que sou árduo defensor do reconhecimento dos direitos dos povos tradicionais do Brasil (índios, quilombolas, favelados, comunidades rurais, comunidades de fundo de pasto), mas tenho certeza que dentro dessa grande área é possível demarcar as terras dos Tupinambás de Una, Olivença e Buerarema, evidentemente, sem os exageros do projeto de demarcação, que beneficiaria dois mil índios em detrimento da expulsão de vinte mil agricultores na mesma situação socio-econômica.
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Mas se houver um diálogo político sério, envolvendo essas populações, eu penso que a ferrovia e o porto teriam mais chances de desembocar no sul da Bahia com muito menor impacto, pelo menos, em terra. Olhando as fotos de satélite podemos encontrar áreas desmatadas nessa faixa de litoral, onde poderia ser implantado o Complexo Porto Sul. Caberia ao governo manter condicionantes ambientais rígidas e atrelar o projeto a significativas compensações sociais para os povos Tupinambás e os agricultores familiares, os mais pobres dessa região.
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O governo sabe, constitucionalmente, que não pode mexer com índio, caverna e sítio arqueológico, mas tem o hábito de substimar a floresta, protegida pela mesma constituição como Patrimônio Nacional. Com a floresta, sítios e cavernas não podemos conversar, nem mudar de lugar, mas com os índios, que são tão poucos diante de tanta terra, isto é possível sim.
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Tenho certeza que o impacto em terra seria bem menor, não apenas em termos de mata atlântica e corais, mais também dos impactos sobre o turismo e a paisagem, apesar dos impactos em mar serem mantidos. De qualquer forma, já seria muito melhor pensar assim do que insistir na atual localização.
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Eu espero que a população de Ilhéus e do sul da Bahia, o prefeito de Ilhéus, os prefeitos da AMURC (Associação dos Municípios da Região cacaueira), todos pensem melhor, que a Bahia e o Brasil discuta mais, e quem sabe, se tecnicamente houver alternativa locacional, mantenha-se o projeto no sul da Bahia. O que não dá mais é continuar dando murro em ponta de faca, seguindo insistentemente por um caminho que não é bom.
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No mais, lamento a inercia da classe política diante do questionamento dos fatos, e o embate grosseiro de tantos ilheenses que querem o Complexo Porto Sul sem refletir. Lamento que parte da sociedade e imprensa regional não queiram entender que o movimento contra a localização do Porto Sul é autêntico, e que precisa ser levado a sério; que ele extrapola o interesse de empresários sulistas e quaisquer interesses pessoais. Está é uma legítima discussão sobre a vida e o nosso futuro.

Comentários

Anônimo disse…
Meus parabéns Paulo, pela tua equilibrada reflexão!

Abração,

Ken.
Anônimo disse…
qualquer alternativa...menos porto de minério e siderurgia.....a chamada abre a possibilidade de convivencia e nao de exclusao dessa ideia louca....

A CHAMADA COMO SUGESTAO PODERIA SER""o porto de minério nao poderia ser em outro local que nao seja aqui?

AQUI NAO PODERIA RECEBER UM INCENTIVO DO GOVERNO PARA FORTALECIMENTO DO POTENCIAL JÁ EXISTENTE?

valeu

paulo emilio
Unknown disse…
Mais uma vez, Paulo, parabéns por esta reflexão valiosa!

Eu não entendo por que Maraú há mais de cem anos, dizem, é um porto natural, que pouparia recursos financeiros, mas insistem neste monstro em Ilhéus; bom seria que as pessoas descobrissem o potencial natural desta região e encontrassem alternativas sustentáveis para nosso paraíso comum...

Um abraço.
efigênia
luzia melo disse…
parabens pelo seu comentario e raciocinio logico
Rafa Andrade disse…
Parabens pela inteligente reflexao.
Pensar nesse projeto do jeito que está me faz sentir vergonha das liderancas socio-políticas da minha própria regiao, como pode um povo ser tao cego?
Rafa Andrade disse…
Parabens pelo inteligente comentario.

Pensar nesse projeto do jeito que ele está, me faz ter vergonha do pensamento atrasado, mediocre e destruidor das liderancas socio-políticas da minha própria regiao.

Suas ideias têm que chegar a ouvidos de mais pessoas Paulo.
eu estou a 8 meses fora do Brasil, nao sei direito como andam as discussoes no dia-a-dia, mas voce já expos suas ideias mais abertamente?

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